| Mariana Chaves | Autora de Newsletter |
|
| | Não é indispensável, porque depende da utilização que se quer dar, mas vamos perceber melhor os prós e contras. | A airfryer é considerada uma fritadeira sem óleo. Podemos dizer que é um híbrido: funciona com ar quente como o forno e precisa de muito pouca gordura (muito menos do que uma fritadeira). Tem uma gaveta com um cesto que permite ao ar circular à volta do alimento e assim torná-lo crocante, quase como numa fritadeira, usando 50 vezes menos gordura – apenas uma colher de sopa, com cerca de 15ml, sendo que uma fritadeira pequena no mínimo leva 750ml de óleo. É também uma confeção muito rápida – quando comparado com o forno, é pelo menos metade do tempo, por vezes até menos de metade –, o que é muito aliciante para os dias sem tempo que vivemos nesta sociedade moderna. | O segundo benefício é claro: o produto final terá muito menos gordura e, portanto, menos calorias, para além de menos perdas nutricionais na confeção da carne, como se viu neste estudo. Logo, fritar na airfryer é mais saudável do que fazê-lo numa fritadeira convencional. Este benefício aplica-se principalmente a quem consome com regularidade batatas fritas, panados e outros fritos. Quem nunca os consome está a abrir uma “porta” para um hábito que não é obrigatoriamente saudável. Porque depende bastante do alimento que estamos a preparar: não é por se colocar um croquete pré-frito na airfryer, apenas com uma colher de azeite, que passa a ser saudável. | Um ponto não tão positivo será: cozinhar a altas temperaturas e não húmidas faz produzir compostos de glicação, ou seja, substâncias a que damos o nome de AGEs – produtos de glicação avançada. Estes AGEs estão associados a inflamação, stresse oxidativo e celulite e intensificam o risco de se descontrolar a glicemia; além disso, estes AGEs dão também a cor escurecida e o tostadinho aos alimentos, sendo assim fácil de identificar. Até porque, quanto mais tempo de exposição, maior será a quantidade destes compostos. São consequência de uma reação que dá pelo nome de reação de Maillard, ou seja, uma reação natural que acontece entre aminoácidos (unidade base das proteínas) e açúcares (unidade base dos hidratos de carbono) quando estes compostos são expostos a altas temperaturas. | Então e se quiséssemos ter uma alimentação mais saudável e retirar todos os alimentos que contêm estes AGEs, isso teria impacto na nossa saúde? Ensaios clínicos obtiveram benefícios com a restrição de produtos de reação de Maillard na dieta, tanto em pacientes com diabetes tipo 2 como em indivíduos saudáveis. Esses ensaios permitiram observar a diminuição do stress oxidativo, a diminuição de marcadores inflamatórios e a melhoria de marcadores de resistência à insulina e de disfunção vascular. | Outro ponto menos positivo da airfyer será a produção de acrilamida, uma substância cancerígena que se forma também por reação de Maillardquando cozinhamosalimentos ricos em carboidratos a altas temperaturas (acima de 120ºC). | Quanto mais escuro, maior a quantidade de acrilamida. Estas altas temperaturas tanto podem ser de fritar como de grelhar ou assar, mas fritar é o que produz a maior quantidade. Acontece, por exemplo, com as batatas. E se cozermos as batatas? Sabemos, baseado nos estudos da FDA , que cozer batatas com casca no micro-ondas, por exemplo, não produz acrilamida. Ou seja, batata cozida ou puré de batata será melhor do que batatas fritas, sendo acompanhamentos relativamente calóricos e desejados por muitos. | A acrilamida não é exclusivo das preparações caseiras. As bolachas, cereais de pequeno e outros alimentos processados também têm, sendo que o produto alimentar que tem em maior quantidade são as batatas fritas de pacote. | Então e vamos ficar todos intoxicados? O nosso corpo tem uma forma para eliminar estas substâncias através de mecanismos que envolvem antioxidantes e reações enzimáticas (por isso é tão importante comer alimentos saudáveis ricos em antioxidantes), mas, se comermos demasiadas substâncias destas, o corpo acumula, levando ao stress oxidativo e à inflamação, que são a base da maioria das doenças crónicas. | Acontece que estes compostos estão associados a imensas doenças crónicas, como as cardiovasculares, renais, diabetes, osteoporose, artrite, Alzheimer, entre outras. E também, em termos práticos, ao envelhecimento da pele e aparecimento de celulite. | Os AGEs fixam-se às fibras de colágeno e elastina, tornando-as mais rígidas, ou seja, com menos elasticidade, o que leva ao aparecimento de celulite, antecipa o envelhecimento da pele, favorece a formação de rugas e linhas de expressão e estimula a flacidez. | Mas será que a acrilamida que se forma na airfryer é em igual quantidade à que se forma na fritadeira comum? Não. Em comparação com a fritura (a 180°C durante seis minutos), a airfryer diminuiu o teor de acrilamida em 47%. Além disso, os resultados da digestão in vitro sugeriram que airfryer resultou em níveis mais elevados de amido de digestão lenta (48,54% – 58,42%) em comparação com os da fritura, o que pode contribuir para níveis mais equilibrados de açúcar no sangue após o consumo. Com base nesses resultados, concluiu-se que a airfryer pode reduzir a formação de perigos alimentares e é relativamente mais saudável do que a fritura convencional em termos calóricos, de preservação de nutrientes e de glicémia final da refeição. | Mas, ainda assim, haverá alguma coisa que se pode fazer para prevenir a formação de compostos tóxicos como AGEs e acrilamida? A marinada, muito conhecida por nós, portugueses, e por todos os países que tradicionalmente têm uma alimentação mediterrânica, reduz a formação de compostos de glicação. Trata-se de uma técnica culinária na qual se deixa de molho o alimento (usamos muito com a carne, mas também com tofu e vegetais) em soluções ácidas, como sumo de limão, vinagre, vinho ou sumo de outras frutas, como laranja ou toranja. O tempo de marinada tem muito impacto na redução da quantidade de AGEs: uma hora de marinada pode reduzir estes compostos até metade. | São vários os componentes destas soluções que permitem este efeito, entre os compostos fenólicos do vinho, a vitamina C do sumo de limão ou outras frutas. E esse resultado ainda pode ser exponenciado juntando alho à nossa marinada, que, ao fermentar na solução ácida, vai potenciar o efeito antioxidante do seu principal composto bioativo —alicina. Para além de atuar na prevenção da nossa saúde, ao reduzir a produção de AGEs, este preparado dará muito sabor sem adicionar sal, o que será uma mais valia nutricional. | E ainda pode demolhar os palitos de batata em água (fria ou quente) e depois secar bem antes de colocar na airfryer. Com isso consegue reduzir a quantidade de acrilamida em valores muito variáveis, mas muito significativos — como diz este estudo. | Verdadeiro ou falso? Não se deve aquecer comida em recipientes de plástico. | Verdadeiro. Muitos plásticos, principalmente macios e maleáveis, contêm bisfenol A (mais conhecido por BPA) ou ftalatos, que são comprovados disruptores endócrinos, ou seja, alteram as nossas hormonas provocando um risco aumentado de doenças graves. Os ftalatos, por exemplo, quando o plástico é aquecido, quebram-se e há risco de penetrarem no alimento, sendo posteriormente ingeridos. A solução melhor será sempre aquecer os alimentos em vidro ou mesmo no prato de loiça. | Uma pergunta frequente nas consultas: em casos de sensação de enfartamento e digestões muito prolongadas, o que se deve fazer? | Nestes casos, é muito importante respeitarmos todo o processo de digestão de forma a não sobrecarregar o nosso sistema digestivo, especialmente no que toca à libertação das enzimas digestivas. Algumas regras possíveis são: | - Mastigar muito bem cada garfada (idealmente, 10 a 20 mastigações). Costumo dizer que o estômago não tem dentes, mas mastigar bem não é necessário apenas para o alimento ir bastante triturado para o estômago — é necessário, principalmente, porque a mastigação vai promover a libertação da primeira enzima digestiva, logo na nossa boca (amilase salivar), que é responsável pela digestão dos amidos, um tipo de hidratos de carbono.
- Comer quantidades mais pequenas. Se a digestão está mais lenta, é possível que a produção de enzimas não seja proporcional à quantidade de alimento. Ou seja, está a comer a mais para o que produz e a solução deverá ser comer porções menores. Só em último caso deve recorrer a suplementos com enzimas.
- Não beber muitos líquidos à refeição (no máximo, um copo médio). O pH que ativa a enzima que digere as proteínas é um pH ácido, que costuma existir no nosso estômago. No entanto, se adicionarmos muitos líquidos, como água, a uma solução ácida, esta diminui a acidez — e isso, neste caso, pode inativar as enzimas. Deixe a quantidade de água para, se se sentir enfartado, poder tomar uma água com gás ou um chá morno, que facilita o esvaziamento gástrico.
| | Michael Greger, médico e uma referência na área da nutrição, escreveu o livro Como não morrer (que foi um êxito) e acrescentou este livro de receitas, que põe em prática todos os seus conselhos sobre alimentação. Juntou-se a este autor o chef vegetariano Robin Robertson, e juntos criaram receitas muito atuais que vão desde taças de cereais, patês com feijão frade, burritos com feijão preto e vegetais, couve flor no forno com molho de limão, argolas de cebola panadas, batidos de vegetais ou de frutas e pudins. Ensinam a usar couve portuguesa, acelgas, miso, levedura nutricional, tahini, farinha de grão e muitos mais ingredientes saudáveis que podem ser difíceis de implementar regularmente na alimentação. Não se assuste se não reconheceu alguns dos ingredientes, porque o encanto deste livro é que, ao mesmo tempo que podem ter alguns ingredientes fora do convencional, as receitas usam todos os vegetais, especiarias e leguminosas que conhecemos e de forma prática, como, por exemplo, polpa de tomate e lata de feijão, sendo por isso um livro para todos. | Gostou desta newsletter? Tem dúvidas sobre alimentação ou quer fazer alguma pergunta que gostaria de ver esclarecida numa próxima edição? Escreva-me para marianachaves@observador.pt. Pode subscrever a newsletter “Posso Comer?”aqui. E, para garantir que não perde nenhuma, pode assinar já o Observador aqui. | Mariana Chaves é nutricionista clínica, autora do podcastAprender a Comer, na Rádio Observador, e do livro Dieta Única (ed. Guerra e Paz, 2016)[ver o perfil completo]. |
| |
|